segunda-feira, 9 de maio de 2011

Socorro! O guarda sumiu

Alí pelos anos 50, 60, chamava-se guarda de trânsito de inspetor de veículo. Ao contrário dos de hoje, eram bem treinados. E trabalhavam, sobretudo, nos horários de rush.  É verdade que o trânsito não tinha nem um décimo dos carros de hoje. Mas também não havia tecnologia, informática, câmeras, essas coisas; as ruas eram mais estreitas e havia poucas, pouquíssimas avenidas e nenhum viaduto. Os sinais eram controlados na munheca, por meio de uma manivela. O inspetor ficava ali (nas principais esquinas, em cima de guaritas), abrindo e fechando, dando mais tempo de verde pro lado de onde vinha mais carro. E multando quem fechava o cruzamento. Só à noite e em feriados os sinais ficavam no automático. Hoje, ficam direto, dessincronizados, indiferentes à demanda de veículos. E os motoristas, sobretudo os de ônibus, fazem a parte deles: trancam os cruzamentos. Guardas nos horários de pico? Nem unzinho pra chá. E se por acaso aparece um, mais atrapalha do que ajuda.

Numa crônica do ano passado, eu disse que parte do problema de trânsito é falta de inspetor de veículo. Meu amigo Stênio Coentro, cabra competente nessa área e em muitas outras, achou graça: “Tás brincando! ‘Inspetor de veículo’ é muito antigo”. E aí, danou-se a falar de mobilidade urbana (expressão da moda), citar números, fluxo nos principais corredores, calha das ruas e avenidas, sistemas informatizados, obras viárias... e por aí foi. Aliás, não foi. Estávamos conversando no carro e, claro, pegamos um baita engarrafamento.

Técnico só pensa em tecnologia. Não cogita o simples, a solução mais óbvia, caseira. A menos que não tenha grana. A NASA encomendou à Parker uma caneta para os astronautas escreverem no espaço. Depois de vários protótipos e uma montanha de dólares, chegaram à caneta espacial. Escrever, a bicha escrevia, mas nada parecido com a maravilha que era escrever com uma Parker 61 aqui na Terra. Com a queda do muro de Berlim e o fim da guerra fria, Estados Unidos e Rússia passaram a compartilhar viagens espaciais. E os americanos pensaram que iam esnobar a caneta dos russos. “Como? Vocês nem caneta usam?” “Não! Usamos lápis.” “Ué! Por que nossos técnicos não pensaram nisso?" Porque tinham grana, brother. E os russos, não. Como a gente aqui no Recife. Ou seja, o inspetor de veículo está para o trânsito da Agamenon, assim como o lápis esteve para as viagens soviéticas. Eles precisavam escrever. A gente, andar.

O negócio é o seguinte. Tem como reduzir a frota e proibir a venda de carro novo? Não, né? Tem grana pra viadutos, metrô, monotrilho e computador? Não, né?  Agora, dá pra contratar e treinar inspetores de veículo pra trabalhar, sobretudo, nos horários de pico? Claro que dá. Dá pra sincronizar os sinais na munheca? Óbvio que dá. É só botar os caras em cima de guaritas, com visão do sinal seguinte, que a gente vai surfar ondas verdes pelo Recife afora. Outra coisa, inspetor de veículo com bloco de multa e caneta (ou lápis) na mão. Se um babaca trancar o cruzamento, multa nele! Quero ver se na segunda, terceira o sacripanta ainda tranca. Se falarem em indústria da multa, deixa falar. Falar por falar, já falam mal paca do trânsito. A diferença é que as pessoas irão falar andando. Quando os palavrões chegarem aos ouvidos do prefeito, os caras vão estar longe.

Por Joca Souza Leão


 

Nenhum comentário:

Postar um comentário